sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Lady Macbeth




                                                                         Por Tiago Silva

                                                                    Para Katia Moller




Oh Lady Macbeth, com teu sorriso sarcástico,

Tuas palavras ébrias, teus ritos incógnitos!

Atravessando a linha inaudível, dirijo-me a ti!

Banho-me nas tuas virtudes descomunais,

Na tua essência juvenil, no teu colo apaziguador!

Não poderia ausentar-me da tua presença,

Sem sofrer calamidades,

Sem buscar tua face nas nuvens,

Sem sentir-me pela metade.

Oh Lady Macbeth, com tua ironia admirável,

Teu abraço desconcertante, tua companhia inenarrável!

Perdido em teu solo fantasioso, dirijo-me a ti!

Deito-me em teus olhos, desmaio sob tua face!

Impensável seria viver longe de tua mente embriagante,

Teus ditos insondáveis,

Tua identidade cativante, tua magnitude incurável!

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012


       Só escrevo quando vivo intensamente, há momentos em que é como mergulhasse e ficasse sem respirar por algum tempo, que me parece durar uma eternidade. E, nesses momentos, não produzo, não me sinto capaz de escrever um parágrafo sequer, escrevo apenas frases, que são fragmentos que me preparam para a próxima descarga de intensidade que está por vir.

       Porque intensidade é tudo, tudo do que preciso para escrever. Talvez por isso, como me disse uma amiga, minha escrita é real, porque só escrevo a partir do que realmente vivo e da intensidade que esse viver pressupõe. É ela quem me impulsiona sempre a dar os próximos dez passos em direção à utopia, sabendo que sempre precisarei de mais dez, e mais dez.

       A partir das muitas personalidades e facetas que vou descobrindo em mim, é que se descortina minha escrita. E é só me permitindo viver e elaborando, digerindo cada uma dessas vivências, que vou conhecendo as muitas mulheres existentes, como diria Almodovar, na pele que habito.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Receta de quererte - Junho/2011


Con urgencia, pero sin prisa

Con calma, pero desesperada

Con delicadeza y fuerza

Duda y certeza

Alegría y dolor

Tímida y sin pudor

Sonriendo y llorando

Durmiendo y despierta

In English y en Español

Con música y en silencio

Parada o corriendo

Con vino o cerveza

Carne o pez

Salado o Dulce

Café o leche

Helado o caliente

Azul o rojo

Algodón o lana

Seda o lino

Real o encantado

El  último y el primero

Siempre y nunca más

Eterno y fugaz.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Sob a cama

“ Ainda lembrava dos dias da infância em que, deitada no chão da área da casa da avó, ficava horas observando nuvens e atribuindo-lhes formatos de coisas conhecidas, ora um elefante, ora um dinossauro, outras vezes um cachorro. Só bem mais tarde, viria a saber que suas interpretações, tanto das nuvens da infância como dos livros que viria a ler mais tarde, seriam baseadas em sua visão de mundo, o que chamamos de subjetivo.

       Houve um tempo em que sua imaginação fertilíssima permitiu-lhe pensar que pessoas poderiam vestir uma fantasia e fingir-se de cachorro. Passou a olhar, então, para os pobres animais, com a desconfiança de que poderia estar sendo espionada por algum adulto. Depois de ouvir as histórias contadas pela avó, sequer ousava por a mão para fora dos limites do colchão, imaginando que monstros terríveis poderiam habitar embaixo da cama. Não conhecia os monstros de armário, tão comuns nos dias de hoje, os seus ficavam espreitando sob a cama, esperando o melhor momento de puxar-lhe pela parte do corpo que pusesse pra fora.

       Jamais sairia de sua memória a história da criança que, por não ter escovado os dentes, teve o rosto roído por ratos, ou da cobra que mamava nos seios da mãe e dava ao filho sua cauda como substituta ao seio materno. Ou ainda das bruxas que durante a noite faziam tranças nas crinas dos cavalos, ou de vampiros que atacavam o gado nos campos. Tantas histórias, muitas vezes, a faziam ver vultos demoníacos nas sombras, passar correndo por lugares escuros, inventar sortilégios que a protegeriam desses seres fantásticos.”

       Histórias de bruxas, monstros e fantasmas sempre povoaram e devem continuar povoando o imaginário infantil, provavelmente o primeiro contato que temos com a literatura. Não a literatura incorporada por livros, mas a história oral, aquela que é passada de uma geração à outra em tardes chuvosas de inverno ou em noites frias antes de se ir dormir, ou até desencadeada por alguma lembrança.

       A necessidade da fabulação, de imaginar-se e viver hipoteticamente essas histórias é inerente ao ser humano, precisamos viajar através de nosso imaginário. Segundo Antônio Cândido, a literatura tem o poder de humanizar, e nada mais humanizador que se colocar em diferentes situações, sejam elas felizes ou não. O exercício de viver outras vidas sem sair da sua, ter experiências que, normalmente não se teria e entregar-se visceralmente a elas, como se fossem reais, esse sim, é o exercício humanizador que somente através da literatura conseguimos, venha ela até nós da forma oral ou escrita.

       A literatura nos permite conhecer países, culturas, pessoas, sentimentos que nos trarão marcas indeléveis e auxilia na construção de nosso subjetivo, ampliando nosso conhecimento de mundo. Nos constituímos, em grande parte, pelo que lemos ou pelo que ouvimos alguém nos contar com todo seu gestual característico, o que não deixa de ser, também, uma leitura.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Como alguém já disse ... felicidade é um estado de ser ...

Desta vez me deixa
ser feliz.
Nada aconteceu a ninguém,
não estou em parte alguma,
simplesmente sucede
que sou feliz        
pelos quatro costados
do coração, andando,
dormindo ou escrevendo.
O que posso fazer, sou
feliz.
( ... ) Tu a meu lado na areia,
és areia,
tu cantas e és canto,
o mundo
é hoje minha alma:
canto e areia
o mundo
é hoje tua boca;
me deixa
em tua boca e na areia
ser feliz (... )

Pablo Neruda

... Talvez sem motivo algum, ou por todos os motivos ...

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Patrícia ... uma personagem

       Combinamos uma saída para beber e outras cositas más, nos encontramos e partimos para a imprevisível jornada. No bar, como de costume quando o grupo se reúne, muitas risadas acompanham a bebida e comentários filosóficos brotam por todos os lados.


       Em determinado momento, saímos todos para dar uma volta, havia uma cerimônia de iniciação a ser realizada. Uma amiga experimentaria, protegida pelo calor do restante do clã, um prazer ainda desconhecido. Saímos os sete, número cabalístico, mais a iniciada e o filhote de gato que uma das meninas havia encontrado em uma casa abandonada e resolvera trazer consigo, então, demos início à cerimônia, todos caminhando e, em nossas mãos, os copos de cerveja.


       Durante a cerimônia, alguém comenta “mas esse negócio era maior, acho que tu já usou, isso tá menor agora, risos” e penso “será possível, o cara ainda nem fumou e já tá viajando, esse troço deve ser muito bom mesmo”. Como diz a música, foi mais ou menos assim: ...acende, puxa, prende, passa..., em instantes a alegria era geral e facilmente constatada pelas risadas do grupo, que iniciava a viagem insólita.


       Uma de minhas constatações da noite foi: só quem já desfrutou dos prazeres de Mari Juana, é capaz de entender seus efeitos. E fiquei alguns momentos divagando se os estudiosos do assunto, alguma vez, teriam compartilhado da sensação que é algo de aprisionante e libertador, ao mesmo tempo. Mas, quem a conhece sabe que as divagações seguem rumos nem sempre coerentes e, muitas vezes, nos pegamos tentando descobrir como os pensamentos chegaram ao pensamento atual, como se quisesse estabelecer uma linha pela qual pudéssemos nos guiar. Óbvio, uma tentativa inútil, mas que ajuda passar o tempo e distrai, momentaneamente, da paranóia que se apodera da mente nesses momentos.


       Aliás, paranóia é a palavra chave dessas ocasiões. Temos a nítida impressão de que está escrito na testa: fumei. Sou normalmente escrava do relógio, e quando encontro com Mari isso se torna ainda pior, chego a consultar o relógio, em média, a cada três minutos com medo de perder o ônibus, com pânico de não conseguir chegar em casa, de não conseguir descer na parada certa, de dar muita bandeira, de falar merda.


       Em contrapartida, o que é muito interessante, é a consciência de tudo o que está acontecendo, ela continua lá, embora pareça que estamos fora do corpo, continuamos nele mesclando as posições em nossa história de narrador e personagem, fora e dentro de nosso corpo. Talvez, em situações normais, não nos apercebamos de detalhes que, em situações como esta, saltam aos olhos. Ouvi conversas interessantes enquanto esperava pelo ônibus, um babaca que se vangloriava para uma, como vou definir, sem noção, de já ter batido em mulher, dirigido bêbado e ainda andar pelas ruas à noite fingindo que iria atropelar quem encontra caminhando. Ah, fala sério!! O cara é um idiota e a não menos idiota achando tudo aquilo bonito, normal. Depois eu é que to muito doida.


       Teve um momento em que estava fumando na rua com uma amiga e ela começou a me dizer “escuta, ouvi um papo.....”, imediatamente pensei “puta merda, alguém descobriu ou tá desconfiado do meu rolo com...”. Mas não era!!! Esse foi um dos momentos em que me dei conta do tamanho da minha loucura. Ainda agora, em casa escrevendo confortavelmente vestida com uma calça de moleton velha, uma camiseta não menos, os cabelos presos de uma forma desleixada, sem esquecer os óculos, coisa de quem já tem 40 ou mais, depois de ter bebido quase todas, ter rido muito de quase tudo e, pra finalizar ainda vomitado os pés, sentada no cordão da calçada, é como se ainda estivesse sob o efeito da insólita viagem. A situação toda, naquele momento, me pareceu Bukowskiana. Fumamos, bebemos, vomitamos, viajamos ... mas tudo com muito, muito estilo. Saldo positivo. Mas, pensando bem, porque a necessidade de classificar ou pesar o valor da noite, se foi só mais uma, como tantas outras ... na vida de Patrícia.



terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

La utopia es caminar

sábado, 4 de fevereiro de 2012

utopia
(latim tardio utopia, palavra forjada por Thomas More para nomear uma ilha ideal em A Utopia, do grego ou-, não + grego tópos, ou, lugar)

s. f.



s. f.

1. País imaginário em que tudo está organizado de uma forma superior.

2. Sistema ou plano que parece irrealizável.
3. Fantasia.
      
       E lá vamos nós, novamente, analisar, porque temos a necessidade mórbida de dissecar, esmiuçar tudo.
       Em nenhum momento a definição do dicionário sobre a palavra utopia a descreve como algo impossível, irrealizável, chega a defini-la como: "que parece irrealizável", veja bem, parace. E nem tudo o que parece, realmente é.
       Fantasia? Pode ser, mas quem pode garantir que não se torne ou seja real para quem a vive, muito se realizou partindo de uma fantasia, de algo que muitos duvidavam ou, com os pés e os olhos demasiadamente fixados no que é comum, e por isso mais simples, não acreditavam ser possível.
       E o que dizer de "País imaginário em que tudo está organizado de uma forma superior"? Esta, na minha opinião, o que não quer dizer grande coisa, é a melhor, a mais poética de todas, muito significativa. Imaginar um lugar onde fosse possível uma existência superior, que fugisse do comum, um modo raro de viver.
       Seria, realmente, uma fantasia escolher para si o modo raro de existência? Deveríamos nos conformar com uma existência medíocre, habitando somente a parte rasa, sem profundidade e, por isso mesmo, confortável?  A zona de conforto pode  proporcionar estabilidade, segurança, por algum tempo, mas nos relega a papéis secundários se não a abandonamos, e deixa de ser tão interessante quanto parecia a princípio, vira prisão.
       Pode até ser utópico, mas quem escolhe e, principalmente, vive intensamente uma existência rara, com seus ônus e bônus, jamais se arrepende, ao menos não pela omissão e se solidariza com as dores alheias, consegue equilibrar-se entre inteligência e emoção que, separadas, perdem seu valor. Porque raro mesmo, é quem vive intensamente prazeres e dores, sem temer olhar o espelho e surpreender-se com a imagem que verá refletida.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012


       Recebera um dia, alguns versos rasgados, de amores inventados, enquanto dormia. Mas mesmo insone e absorta que estava, por suas mazelas, trazia consigo a incapacidade de olhar pro lado, e ver, ou apenas permitir-se sentir. Talvez o único papel desejado fosse o de expectadora da própria existência, afinal, quem assiste não assume os riscos, apenas se deixa conduzir pela história de um narrador cansado e sem imaginação.

       Havia um discurso bonito, de que não queria nada previsível em sua vida, estacionado nos lábios como carro velho, que estraga e o dono não quer mandar rebocar, por achar que não vale o investimento. O medo do desconhecido e, principalmente, de perder o controle já havia se estabelecido e não deixava que desse nenhum passo, imobilizava-a completamente e anestesiava seus sentidos, impedindo a entrega.

       Optara, então, pelo mais simples, que não oferecia riscos, por ficar no raso e só molhar os pés, porque sentir-se desnuda pelo olhar de quem sabia compreender seus intertextos, seria muito perturbador e acabaria com sua tranquilidade e com a imagem a tanto custo forjada.

       Tarde demais, agora era só um carro velho, abandonado no meio fio, esperando por gatos ou cães de rua, como visitantes eventuais em madrugadas frias durante o inverno.
sarcasmo
(grego sarkasmós, -ou)
s. m.
s. m.
Ironia amarga e insultuosa. = ESCÁRNIO


transparência
(transpar[ecer] + -ência)
s. f.
s. f.
1. Qualidade do que é transparente. = DIAFANEIDADE
2. Superfície ou tecido transparente.
3. Película ou folha de material transparente onde se escreve ou imprime o que se destina a ser reproduzido com um .retroprojetor. = ACETATO

       Duas palvras, como no conto de Isabel Allende, somente duas palavras. Mas com significados totalmente diferentes, faz-se uso delas em situações diversas, com objetivos contrários.
       A primeira, sarcasmo, como a definição bem explica, é usada quando se quer insultar, ferir e, porque não dizer, tripudiar. Sua utilização pode vir devido aos mais variado fatores, se formos analisar detidamente o que leva alguém a desejar insultar outro. Talvez por insegurança, o que seria compreensível, uma vez que não se ataca quem não oferece perigo, ou autoafirmação: preciso mostrar o quanto sei ser sarcástico, como sei fazer uso das palavras, arranjá-las de uma maneira que venha a comprovar, até para mim mesmo, minha habilidade. Ou por rancor, quem apanha, ou pensa que apanhou e não elaborou, precisa bater de volta.
       A segunda, transparência, definida como "qualidade do que é transparente", e poderia completar com: aquele que se deixa ver, que não se esconde, não se camufla e que, finalmente, não precisa usar de sarcasmo, porque faz e diz exatamente tudo o que pensa ou faz. O transparente não tem receio de visualizações e, muitas vezes, pode deixar margem a interpretações equivocadas mas, ainda assim, continua sem se esconder atrás de uma agressividade dissimulada, não precisa atacar para se defender. Aliás, nem sequer se defende, porque simplesmente não precisa, seus atos  e palavras falam por si, não guarda rancores ou alimenta mágoas, e suas feridas aparecem expostas, sem pudores.
       Semanticamente podemos conhecer ambas, associar a comportamentos, situações ou mesmo pessoas que tenhamos conhecido. Mas, e volto a usar uma expressão de que gosto muito, e a habitação da palavra? Assim como só compramos uma roupa e a usamos antes de um prévio exame diante de nossos espelhos, da mesma forma escolhemos as palavras e atitudes conforme o sentido que lhes atribuímos. Habitamos plenamente o sentido das palavras.
       Prefiro, particularmente, a segunda. Por que? Pelo sentido e pela tranquilidade que me proporciona, por saber que ainda que não seja agradável a todos os que enxergam através, é exatamente isso o que estão vendo, gostem ou não. Da primeira, só conheço a semântica e prefiro não fazer uso.
       Poderia ter incluído mais uma palavra para explorar o sentido: respeito. Bonita em seu significado e que serve até para  justificar, ou não, o uso das anteriores na plenitude de seu sentido.
       Já tenho as minhas, escolha as suas !!!