domingo, 11 de novembro de 2012






O surgimento da indústria cosmética

 

       Havia inicialmente a proibição ao desenvolvimento de atividades industriais na colônia, uma vez que a corte não admitia a possibilidade de seu domínio tornar-se financeiramente independente. Tal alvará foi revogado quando da chegada da família real ao país, tendo seu regente optado por medidas protecionistas, sobretaxando bens de consumo provenientes do exterior. Medida tomada no afã de alavancar o desenvolvimento industrial de um país com uma economia essencialmente agrícola, que ainda conservava um regime escravagista, o que impedia a existência de mão de obra para tal empreendimento, havia carência de um mercado consumidor, que fosse constituído por trabalhadores assalariados.*

      Medidas institucionais e sobretaxas à parte, o imperador exercia sobre ela, sobre suas células, uma capacidade cosmética digna de aprofundado estudo. Verdade que trazia-a escrava, cativa de seus encantos, incapacitada de sequer pensar na possibilidade de qualquer outro mercado consumidor. A cada vez que se mirava ao espelho a suspiradora podia constatar o bem que esse homem fazia-lhe, sua pele, cabelos, e por que não dizer, até sobre o brilho dos seus olhos, dele, tinha a influência. Presa ela ficara, desde ao primeira troca de olhares, naquele visgo.

       Muitas haviam sido as vezes que ela pode constatar aquela influência em seu corpo. Desde que encontrara pela primeira vez com os olhos de anzol, havia sentido até no movimento de seus quadris uma sutil diferença, movia-se agora com uma sensualidade antes desconhecida, como se todos os seus passos fossem para encontrá-lo, caminhava lascivamente em sua direção, sentindo o calor daquele olhar sobre si. A cada vez que seus olhos pousavam sobre ela, renovava-se algo, efeito a que nenhuma vitamina E podia-se comparar, eliminava radicais livres, ainda nem descobertos, de forma assombrosa.

       Por mais que tentasse fugir desse contato, e realmente tentara, infrutiferamente, por muitas vezes, não podia negar o bem que faziam-lhe, seus olhares, sorrisos e indelével presença. Fazia bem a ele, o exercício, e a ela, aqueles olhos famintos. Ainda podia ouvir-lhe acariciar os ouvidos, e renovar-lhe o corpo e a alma, ao recitar Neruda, em voz cálida e rouca ...

“... sin que seas, en fin, sin que vinieras
brusca, incitante, a conocer mi vida,

 ráfaga de rosal, trigo del viento,

y desde entonces soy porque tú eres,
y desde entonces eres, soy y somos,
y por amor seré, serás, seremos.”

(Pablo Neruda, Soneto LXIX)

 

       Fazia-lhe bem à mente, manter-se cativa tinha lá suas vantagens, tanto quanto fazia-lhe ao corpo, ao despertar-lhe, todos,  os sentidos.
 
* Agradecimentos à minha amiga Caroline Zanini, pela ajuda na pesquisa histórica.

0 comentários:

Postar um comentário