O surgimento da indústria cosmética
Havia inicialmente a
proibição ao desenvolvimento de atividades industriais na colônia, uma vez que
a corte não admitia a possibilidade de seu domínio tornar-se financeiramente
independente. Tal alvará foi revogado quando da chegada da família real ao país,
tendo seu regente optado por medidas protecionistas, sobretaxando bens de
consumo provenientes do exterior. Medida tomada no afã de alavancar o
desenvolvimento industrial de um país com uma economia essencialmente agrícola,
que ainda conservava um regime escravagista, o que impedia a existência de mão
de obra para tal empreendimento, havia carência de um mercado consumidor, que
fosse constituído por trabalhadores assalariados.*
Medidas institucionais e
sobretaxas à parte, o imperador exercia sobre ela, sobre suas células, uma capacidade
cosmética digna de aprofundado estudo. Verdade que trazia-a escrava, cativa de
seus encantos, incapacitada de sequer pensar na possibilidade de qualquer outro
mercado consumidor. A cada vez que se mirava ao espelho a suspiradora podia
constatar o bem que esse homem fazia-lhe, sua pele, cabelos, e por que não
dizer, até sobre o brilho dos seus olhos, dele, tinha a influência. Presa ela
ficara, desde ao primeira troca de olhares, naquele visgo.
Muitas haviam sido as
vezes que ela pode constatar aquela influência em seu corpo. Desde que
encontrara pela primeira vez com os olhos de anzol, havia sentido até no
movimento de seus quadris uma sutil diferença, movia-se agora com uma
sensualidade antes desconhecida, como se todos os seus passos fossem para
encontrá-lo, caminhava lascivamente em sua direção, sentindo o calor daquele
olhar sobre si. A cada vez que seus olhos pousavam sobre ela, renovava-se algo,
efeito a que nenhuma vitamina E podia-se comparar, eliminava radicais livres,
ainda nem descobertos, de forma assombrosa.
Por mais que tentasse fugir desse
contato, e realmente tentara, infrutiferamente, por muitas vezes, não podia
negar o bem que faziam-lhe, seus olhares, sorrisos e indelével presença. Fazia
bem a ele, o exercício, e a ela, aqueles olhos famintos. Ainda podia ouvir-lhe
acariciar os ouvidos, e renovar-lhe o corpo e a alma, ao recitar Neruda, em voz
cálida e rouca ...
“... sin que seas, en fin, sin que vinieras
brusca, incitante, a conocer mi vida,
brusca, incitante, a conocer mi vida,
ráfaga de rosal,
trigo del viento,
y desde entonces soy porque tú eres,
y desde entonces eres, soy y somos,
y por amor seré, serás, seremos.”
y desde entonces eres, soy y somos,
y por amor seré, serás, seremos.”
(Pablo Neruda, Soneto LXIX)
Fazia-lhe bem à
mente, manter-se cativa tinha lá suas vantagens, tanto quanto fazia-lhe ao
corpo, ao despertar-lhe, todos, os
sentidos.
* Agradecimentos à minha amiga Caroline Zanini, pela ajuda na pesquisa histórica.
0 comentários:
Postar um comentário